OS BEBÊS E A TECNOLOGIA

Uma reflexão pertinente da atualidade é sobre essa geração aonde os filhos; nativos digitais, ou seja, que nasceram já na era digital, são diferentes dos pais, que são denominados imigrantes digitais. 

O termo “imigrantes digitais” se refere a uma geração que não nasceu na era digital, mas se adaptou a ela e faz uso de seus benefícios.

Os alunos de hoje- do maternal à faculdade – representam as primeiras gerações que cresceram com esta nova tecnologia. Eles passaram a vida inteira cercados e usando computadores, vídeo, games, tocadores de música digitais, câmeras de vídeo, telefones celulares, e todos os brinquedos e ferramentas da era digital. Em média, um aluno graduado atual passou menos de 5.000 horas de sua vida lendo, mas acima de 10.000 horas jogando vídeo games (sem contar as 20.000 horas assistindo televisão).Os jogos de computadores, email, a Internet, os telefones celulares e as mensagens instantâneas são partes integrais de suas vidas. Agora fica claro que como resultado deste ambiente onipresente e o grande volume de interação com a tecnologia, os alunos de hoje pensam e processam as informações bem diferentes das gerações anteriores. Estas diferenças vão mais longe e mais intensamente do que muitos educadores suspeitam ou percebem. “Tipos distintos de experiências levam à distintas estruturas de pensamento” diz Dr. Bruce D. Barry da Faculdade de Medicina Baylor… é bem provável que as mentes de nossos alunos tenham mudado fisicamente, e sejam diferentes das nossas, sendo resultado de como eles cresceram. Mas se isso é verdade ou não, nós podemos afirmar apenas com certeza que os modelos de pensamento mudaram. (Presnky, 2001). 

 

Se a criança aprende através de suas experiências sensoriais; o toque, o cheiro, o sabor, enfim algo concreto, até que ponto essas experiências reais estão sendo substituídas por tecnologias que podem comprometer as interações pessoais (pais/filhos) e substituir as vivências concretas, fundamentais na construção do repertório da criança ao longo de sua Infância? 

Será que não existe uma diferença entre os imigrantes digitais que tiveram a possibilidade dessas experiências reais, concretas e agora se beneficiam da tecnologia e os nativos digitais que podem estar sendo privados dessa etapa?

Esse é um ponto que sempre questiono na medida que o mundo digital nos apresenta dispositivos que tem como propósito ampliar nossas experiências. Será que jogos, aparatos 3D, por mais realistas que sejam, proporcionam aos bebês a mesma experiência que o mundo real, concreto, sensorial? E ainda, será que tem a capacidade de exercitar seus músculos sociais?

Considero a tecnologia uma ferramenta muito útil, nos permite avançar como nunca, nos favorece em muitos aspectos, mas estudos comprovam  que precisa ser usada com cautela, quando se trata de crianças, principalmente na faixa etária de 0 a 3 anos, momento crucial aonde as relações com o mundo e com as pessoas ao seu redor são a base para a construção do sujeito. Para que a interação entre adulto e criança possa ser de fato um encontro, adulto e criança devem se implicar neste encontro, e para isso precisam estar disponíveis.

A Academia Americana de Pediatria recomenda tempo zero em frente à tela para bebês com menos de 2 anos e a Sociedade Pediátrica Canadense recomenda não mais de trinta minutos por dia para crianças na mesma faixa etária.

Permitir que a criança seja ela mesma, se retirar um pouco, deixá-la respirar, cometer erros, assumir riscos, sonhar, ter prazer na suas próprias descobertas e, porque não, tempo para fracassar também. De quanta liberdade precisam? Quanta tecnologia? Difícil precisar, mas, acredito que descobriremos o melhor caminho partindo do pressuposto de que não se pode negligenciar que bebês precisam de conexões humanas, aprendem na interação com pessoas significativas para eles. 

Nascemos com uma “programação” que nos possibilita o aprendizado desde o nascimento, mas que terá seu potencial atingido se estivermos emocional e psicologicamente preparados. Para isso devemos deixar que as crianças adquiriram suas habilidades interpessoais em situações da vida real.

A TÃO FALADA AUTONOMIA

Dar espaço e tempo à criança, segundo vários autores relaciona-se à forma de olhar e enxergar a criança. Como eu vejo a criança? Qual é a concepção de bebê que prevalece em nossa época? Esses aspectos irão nortear a postura dos pais nos momentos de interação com seu filho. Se enxergam o bebê como um sujeito passivo, sem iniciativas e incapaz, que precisa ser constantemente estimulado para se desenvolver e descobrir o mundo, é mais provável que o tempo do adulto, que é diferente do tempo do bebê, se imponha resultando num compasso mais acelerado.

Conforme discutido por Truchis-Leneveu (1998, p. 27), a qual por sua vez fundamenta-se na abordagem de Pikler Lóczy, a observação é um elemento primordial e, auxilia no entendimento e, por consequência, na produção de melhores respostas às necessidades da criança.

O instituto Lóczy, onde se originou a abordagem Pikler Lóczy foi fundado em 1946, sendo uma instituição de acolhimento de crianças órfãs de Budapeste. Sua fundadora, Emmi Pikler, pediatra, fez seus estudos em Viena nos anos 20 e detentora de ideias progressistas, acreditava que a saúde somática e psíquica seriam indissociáveis, ainda que o termo “psicossomático”, tenha sido definido 30 anos depois, pela OMS (Organização Mundial de Saúde).

Confiar na criança, que já nasce potente, capaz de realizar, propicia aos adultos a chance da criança não mais ter que corresponder às normas, sejam dos médicos, da família, mas dar possibilidade de desenvolver sua própria originalidade. Metas muitas vezes são estabelecidas por profissionais da saúde, da educação, familiares mas não levam em conta as particularidades e especificidades do sujeito, se atendo a gráficos, tabelas e muitas vezes até mesmo ao senso comum.

Continua o autor afirmando que nessas condições as crianças se sentem mais confiantes, menos dependentes do adulto. Adulto, que de algum modo, se torna colaborador da criança no seu trabalho de descoberta e de construção de si mesma. A criança é o sujeito, o ser ativo, se permitirem que ela o seja. Atitude, essa mais “leve”, mas não com menor grau de responsabilidade.

E ainda, que é um desafio para o adulto se segurar e não fazer pela criança. Quem não terá o ímpeto de ajudar uma criança pequena a descer do sofá ou até desembrulhar rapidamente um presente que a criança ganhou e que, provavelmente, no seu ritmo talvez levasse mais tempo explorando o papel, sua textura, seu som até chegar ao presente.

E, assim, o adulto pode dar mais espaço à criança, é como se ele fosse se retirando “na ponta dos pés” à medida que a criança caminha em direção à autonomia.

A ABORDAGEM DO ESPECIALISTA

O trabalho junto aos adultos cuidadores, sejam famílias ou os profissionais que trabalham com essas famílias deve ser muito cuidadoso e respeitoso.

Nesse campo frequentemente questiono o papel do “especialista” que, geralmente se apresenta aos pais como o detentor de um conhecimento “científico” e por isso, estaria habilitado para sugerir condutas. Até que ponto o especialista favorece a relação dos pais/ bebês? Qual seria uma melhor abordagem para não ser um golpe à autoconfiança dos pais? 

No artigo intitulado “Educação para a saúde através do rádio” (escrito em 1957), Winnicott observa: 

“Nesses momentos, a tendência deles (pais) é sentirem-se culpados, e recorrerão voando a qualquer um que lhes fale com autoridade, que dê ordens”

“É facílimo fazer com que (os pais) se sintam incompetentes”

 

Em seus textos, Winnicott mostra-se extremamente sensível às interferências do especialista no campo da família, sobretudo no caso de bebês e crianças pequenas e, sem ser prescritivo, deixa bem claro o que não deve ser feito no contato dos profissionais com os pais. 

Oferece pistas para uma posição possível diante da demanda destes: a observação, a possibilidade de escutar e, no máximo, devolver aos pais o que eles contaram e de “deixar que a solução apareça por si só”. Adverte ainda sobre a inadequação da expressão de juízos morais nesse tipo de contato. 

Com base nesse raciocínio nosso objetivo junto aos familiares, é sensibilizar o olhar que os pais dirigem às crianças, permitindo mais espaço a elas. E assim, que adultos consigam, com seu próprio repertório, sentirem se aptos, encorajados nessa aventura que é criar um filho.

 

Mas o que é, para cada família, um ambiente adequado para que seu bebê cresça feliz e saudável? A cultura atual exerce relevante influência nessa questão. O que prega como sendo o melhor, tratando-se de cuidados com bebês? Desde a gestação, pais são inundados de informações. Buscam e, muitas vezes, recebem orientações – querendo ou não – sobre como criar seus bebês. Há muitos best-sellers dizendo como os pais devem, por exemplo, lidar com a questão do sono ou como estimular seus bebês. Também chama atenção as superproduções que giram em torno do bebê: chá de fraldas, as compras para o enxoval, o nascimento, aniversários mensais, festa de um aninho e assim por diante.

Não é tarefa fácil para os pais da atualidade que são instigados ao consumo desenfreado seja de objetos, manuais sobre como criarem melhor seus filhos ou tendências que prometem preparar melhor seus filhos, tomarem certa distância e interceptarem esse discurso do consumismo. Há os que conseguem certamente, mas é um exercício diário e cheio de armadilhas. Senso crítico e reflexões são necessários, ao longo do caminho, contrapondo os princípios e os valores de cada família às ofertas do “mercado”.

Seguindo essa tendência, abre-se um espaço maior à palavra do especialista. Pais que se sentem com menos autoridade diante dos filhos, pressionados a serem pais perfeitos, angustiados, costumam recorrer ao especialista. 

No artigo “A sabedoria dos pais e as certezas do especialista” apresentado nos Estados Gerais da Psicanálise, em 2005, Cavalcanti observa: 

 

Esse encontro acontece, portanto, sob efeito de uma combinação explosiva: as certezas do especialista, respaldadas pelo saber sobre a criança- objeto de estudo cada vez mais precoce, haja vista as pesquisas com os bebês e mais recentemente com fetos – e as incertezas e inseguranças dos pais que se sentem cada vez mais desautorizados perante os filhos. O efeito nefasto dessa coincidência é que os especialistas terminam induzindo o que pretendiam evitar e os pais não têm como se situar frente a isso.

 

A percepção é que muitas vezes, com a intenção de “preparar” os filhos para o mundo e sendo bombardeadas por informações, condutas, receitas, o resultado é ansiedade, a sensação de quanto mais estímulos proporcionarmos aos bebês, mais aptos, inteligentes estarão. Correndo o risco de não prestar atenção para quem é aquela criança, quais suas reais necessidades, seu tempo e seu ritmo.Com a melhor das intenções, ao invés de ajudar corre- se o risco de atrapalhar o percurso natural da criança.

Pautada nessa visão, na interação com os pais, ao invés de dar o primeiro passo, observamos, esperamos, nos colocamos à disposição mas sem despejar alguma informação ou comentário sem sermos solicitados. Espera-se que a iniciativa seja deles. 

Se se diz às mães que façam isto ou aquilo, não tardam em ficar confusas e (o mais importante de tudo) perdem o contato com a sua própria capacidade para agir sem saber exatamente o que está certo e o que está errado. É facílimo fazer com que se sintam incompetentes. Se, para tudo, tiverem de consultar um livro ou escutar rádio, estarão sempre atrasadas quando quiserem fazer as coisas certas, porque as coisas certas têm de ser feitas imediatamente. Só é possível agir exatamente no ponto certo quando a ação é intuitiva ou por instinto, como se costuma dizer. (Winnicott, 1999 p.6)

 

Na grande maioria das vezes, os responsáveis nos procuram e trocamos ideias pertinentes ao universo infantil. Considero extremamente rica essa troca e nosso objetivo é que se estabeleça realmente um diálogo. Percebo que a escuta, muitas vezes, já pode ser suficiente para atingir o objetivo de acolhimento à família. 

 

O mesmo respeito que defendemos nas relações Adultos & Bebês, é fundamental na relação do especialista com os familiares, sem nunca desautorizar seus saberes.

“Deixem o bebê em paz!”: reflexões sobre o papel do adulto no fascinante mundo dos bebês

“Deixem o bebê em paz!”: reflexões sobre o
papel do adulto no fascinante mundo dos
bebês

POR Paula Saretta e Ana Maria Bastos*

Quando pensamos em um bebê recém-nascido e antes de 1 ano de idade
o que, normalmente, nos vêm à cabeça? Dependência, fragilidade,
passividade, cuidados…
Sim. O bebê humano, diferente dos outros animais, nasce frágil,
desprotegido para enfrentar o mundo. Para sua sobrevivência, um
adulto é imprescindível. Ele necessita de assistência, ou seja, alguém
que o alimente, que o mantenha aquecido, faça sua higiene, mas que
além desses cuidados orgânicos; um adulto que o introduza no universo
das trocas afetivas.
No entanto, faz parte de uma grande parte de adultos acreditar que
temos que ensinar absolutamente tudo para os bebês. Não só ensinar,
mas também prever, determinar e proteger aquele ser humano
aparentemente tão frágil e dependente, não é?
O conceito de criança ativa, competente desde seu nascimento e rica
de iniciativas,  de desejos e interesses próprios a partir de estímulos e
do ambiente que o rodeia ainda parece distante de grande parte das
práticas que temos observado no cuidado e na educação de bebês.
Nós, adultos, temos mania de dizer: “ele adora essa cadeirinha” ou “ele
só quer ficar no colo, é muito manhoso, se coloco no chão, abre um
berreiro”. Frases comuns que denotam uma leitura dos desejos do
bebê, sempre a partir do ponto de vista do adulto.
Vocês já pararam para pensar que pode ser bem mais fácil do que
parece? Que não há necessidade de intervir, ensinar, agir o tempo
todo, controlando, fazendo, pegando objetos, organizando o ambiente,
etc.? O olhar atento, a observação aguçada de seus movimentos pode
ser algo tão fascinante que podemos ficar horas tentando compreender
o que está se passando na cabeça daquele bebezinho…

A defesa que aqui fazemos[1] é de que, tantas vezes, não damos tempo
suficiente para suas descobertas, seus interesses, impedimos, isso sim,
que ele se desenvolva com mais autonomia, que ele escolha o que quer
explorar, conhecer, brincar…
Vamos pensar em alguns exemplos. Mostramos como se brinca
“corretamente” com um determinado brinquedo de montar, oferecemos
um brinquedo de cada vez e solicitamos que ele faça exatamente o que
pretendemos que ele faça. Ou seja, se ele (o bebê) pegar um
bonequinho e colocar na boca, muitas vezes, tiramos e avisamos: “esse é
pra brincar assim (e faz o gesto)… Não para morder”. Ou quando ele
pega blocos de montar e coloca um ao lado do outro e, mais uma vez,
intervimos: “não, esse é para empilhar, veja só como eu faço…”
Intervenções comuns, cheias de boas intenções… Mas, de fato,
eficientes, do ponto de vista do desenvolvimento global?

Explicando melhor: a criança que
sempre é estimulada, por meio da mediação constante do adulto de
como ele deve agir, fazer, montar, pegar, brincar, etc. torna-se uma
pessoa que está sempre esperando que algo aconteça com ela. Sempre
esperando que alguém venha até ela, que diga o momento da atividade,
que diga o que deve ser feito agora… Passivamente. Sem iniciativas.
Sem criações singulares, sem desenvolver sua capacidade de escolher,
sem conhecer-se, sem conhecer seus interesses particulares, etc..
Quer outros exemplos? O momento da troca, como geralmente
acontece? Os momentos de cuidados corporais têm extrema
importância na construção dessa ligação que será estabelecida entre o
bebê e cuidador. Nas atividades corriqueiras, muitas vezes realizadas
de maneira automática, como a troca de roupas, sono, alimentação,
banho são propícios para o conhecimento do bebê e perceber suas
singularidades. Mas para que isso ocorra, o olhar do cuidador deve ser
sensibilizado e “treinado” para  o reconhecimento dessas
particularidades.

Nesta linha de pensamento, entendemos como
importante que o adulto deixe o bebê participar e intervir nos cuidados
que lhe são dedicados, de acordo com suas possibilidades e
competências. A maneira como o bebê é tocado, pode ser uma fonte de
prazer, agradável, ou pode até gerar desconforto, ansiedade e
insegurança. O que é facilmente percebido pelo incômodo que ele
manifesta em seus gestos.
Assim, o modo como vamos nos conectar com eles depende do que
entendemos, das nossas crenças de como cuidar e interagir com os
bebês. Se partimos do princípio que eles são pessoas que tem uma clara
influência sobre os acontecimentos de sua vida, se pensarmos que eles
estabelecem relações e têm interesses próprios, as coisas podem
mudar de figura.
Babá ou escola? O que é melhor? Depende. Depende do que cada um dos
ambientes pode proporcionar para ele, para seu desenvolvimento pleno.
O papel do adulto, a relação que estabelece com o bebê é que faz toda
diferença! O que temos que garantir, então? Além de atividades
diversificadas, interessantes e motivadoras, adultos que respeitem a
autonomia do bebê, que estabeleça uma relação de segurança e
respeito com ele.
Só assim, quando essa relação for de confiança mútua e não de
dependência exacerbada, será possível discriminar as manhas das reais
necessidades. Será possível saber o que, de fato, ele está precisando.
Tantas vezes, se eles pudessem falar usando palavras, certamente
diriam: “Ei, me deixem em paz, estou gostando de ficar aqui!”, “Quero
conhecer meu corpo, brincar com minhas mãos”, “Eu sei que sou capaz
de mudar de posição, mas tenho meu tempo. Ele não é o mesmo que o
seu, não precisa ficar angustiada com isso e vir aqui me ajudar toda
hora”…

A conexão afetiva que o adulto estabelece com o bebê não tem receita,
mas para ser boa e prazerosa para ambas as partes, é preciso atentar-
se para um conceito simples, lógico, mas de difícil aplicação,
principalmente nos tempos atuais: observe o tempo do bebê, respeite
seus interesses, suas vontades e desejos.
Em poucos palavras: a troca de olhares, os gestos, tudo deve ser
pensado e realizado de maneira respeitosa àquele ser que, ainda não
conseguindo se expressar com palavras, diz muitas coisas à alguém
realmente interessado em escutá-lo!
_________
 Ana Maria Bastos é mãe do Theo e da Nina. Atualmente é a
responsável no Brasil pelo empresa Descobrir Brincando,
adaptado a partir dos fundamentos da pediatra Emmi Pikler. Ana
morou na Suíça e África do Sul. Seu trabalho é junto aos
profissionais e famílias com objetivo de ajudar na importante
tarefa de cuidados da criança pequena. E acredita que ao
fortalecer os adultos cuidadores, crianças se desenvolvem em
sua integralidade, nascendo assim uma sociedade mais justa e
saudável! Para maiores
informações: www.descobrirbrincando.com.br
 Paula Saretta . Doutora em Educação pela Unicamp. Mestre em
Psicologia escolar pela PUCC. Responsável pela Consultoria em
Psicologia e Educação Ouvindo Crianças.

[1] Nossos argumentos são baseados em uma abordagem defendida por
uma médica pediatra húngara chamada Emmi Pikler (1904-1984).
Falaremos mais sobre isso nos próximos posts, com dicas práticas de
como auxiliar os bebês a terem mais autonomia e liberdade de
expressão.

O NOSSO TEMPO E O TEMPO DO BEBÊ

Por Ana Maria Bastos Fonte

TCC O Tempo de Bebê
O NOSSO TEMPO E O TEMPO DO BEBÊ

Ao longo dos últimos anos, a infância tem se tornado uma corrida rumo
à perfeição e mesmo antes do bebê nascer, normalmente, os pais já
planejam seu futuro, mesmo que de maneira inconsciente, traçando metas e
expectativas.
Levando em conta a história e o repertório pessoal dos futuros pais,
eles fantasiam como será seu bebê, e as relações que se estabelecerão;
muitas vezes idealizam como será o exercício da maternidade e da
paternidade. Aliado a isso, os pais se deparam com o modo como se vê e se
cuida do bebê na época em que vivem.
Que os pais desejem coisas para seu bebê é essencial para sua
constituição psíquica, no entanto, é também fundamental que suportem que
essas expectativas não sejam atingidas, que seus bebês não sejam
exatamente como sonhados, imaginados.
Pois senão corre-se o risco de se passar por cima do que as crianças
querem e precisam ter contato; experiências que façam sentido a elas no seu
tempo espaço particular.
Na atualidade, a preocupação excessiva com o desempenho infantil
em um mundo cada vez mais competitivo e tecnológico pode influenciar as
relações da família comprometendo algo muito importante: o tempo.
O tempo e o espaço que cada bebê, individualmente, necessita na
aquisição de competências nas dimensões de desenvolvimento
principalmente motora e cognitiva.
Os pais, geralmente, muito bem intencionados, almejam o melhor para
seus filhos e, neste intuito, tentam “acelerar” o processo de desenvolvimento
infantil, como se fosse uma corrida. Não que seja uma característica somente
da atualidade, pois é sabido que na Europa Medieval já se usava cordas e
molduras de madeira para encorajar os bebês a andarem mais cedo.
Mas, hoje em dia, há uma pressão maior na obtenção de vantagens
dessa fase inicial de construção do cérebro dos bebês, que pode ser
explicada por um conhecimento maior da neurociência, além de um aumento

dessa demanda, especialmente no âmbito da Primeira Infância. Será que
quanto mais rápido, melhor?
Devemos à neurociência – o estudo do funcionamento do sistema
nervoso – grandes avanços e a ênfase nas oportunidades de intervenções
precoces com ganhos inimagináveis em situações aonde tratamentos se
beneficiam da plasticidade cerebral, trazendo resultados muito positivos.
Mas, minha questão é: Será que estamos fazendo uso desses
conhecimentos científicos da melhor maneira?
Criar filhos sempre foi uma tarefa complexa, desafiadora, mas hoje,
com expectativas tão altas, a carga gerada aos pais que almejam ser
perfeitos pode ser exaustiva e tornar o exercício da parentalidade uma
verdadeira maratona.
Uma explicação comumente ouvida é que a competividade do mundo
atual faz com que as crianças precisem desenvolver habilidades para se
preparar desde cedo para enfrentar o futuro.
Com isso, surgem práticas que podem privar os bebês e as crianças
pequenas de participar ativamente de um percurso fundamental no seu
processo de desenvolvimento. A criança pequena se apropria do mundo
através de experiências sensoriais e interações com pessoas vinculadas a
ela. Para aprender uma determinada língua, por exemplo, não basta colocar
à disposição um iPad repetindo palavras em outra língua, mas só a presença
do outro interagindo, um outro que não seja qualquer para o bebê, quer dizer,
com quem o bebê tem uma relação, falando em outro idioma é que pode
promover esse aprendizado. Quando pensamos em hiperestimulação,
partimos do pressuposto que bebês são passivos e impotentes.
Por meio dos encontros que tenho mediado em espaços de educação
formal e não formal entre adultos (pais, mães e avós) e bebês, tenho
observado o impulso e urgência, por parte dos adultos, de acelerar os
estágios do processo de desenvolvimento infantil.
A ideia é que esse adulto cuidador se conecte e perceba as
especificidades e as particularidades da criança. Criança essa competente,
capaz e ávida para descobrir o mundo.
A partir de minhas observações em relação à postura dos adultos, o
que tenho percebido muitas vezes é a dificuldade deles estarem presentes,

atentos e sem interferir ou tentar fazer pelas crianças, respeitando o tempo e
ritmo individual.
Acredito que essa dificuldade pode ser resultado de uma sociedade,
que consome uma gama enorme de informações numa velocidade muito
grande, que acaba dando ao tempo uma outra dimensão. A facilidade no
acesso às informações bem como tecnologias que permitem otimizar o
tempo, realizar várias tarefas simultaneamente, ditando um novo ritmo.
Por que algumas vezes pode ser tão difícil enxergamos o bebê como
ele se mostra?
Penso que a vida moderna tende a nos impulsionar a realizar muitas
atividades ao mesmo tempo, consumimos muita informação, imprimindo um
ritmo acelerado e dificultando vivermos o presente. Estamos geralmente
realizando tarefas e concomitantemente pensando no que está por vir.
Meu convite é darmos esse espaço, tempo e esperar:
Esperar antes de interromper uma atividade, dar a oportunidade às
crianças continuarem o que estão fazendo, construindo um pensamento.
Esperar para que a criança tenha a chance de resolver um problema,
mas sem abandoná-las;
Esperar pela descoberta da criança. Quando você ensina para criança
algo, você tira para sempre a chance dela descobrir sozinha” Jean Piaget
Esperar e observar o que a criança está fazendo antes de tirar
conclusões.
Esperar antes de intervir num conflito entre bebês, muitas vezes o
conflito pode ser resolvido entre eles.
Esperar para que eles consigam expressar seus sentimentos, ainda
que para muitos adultos seja difícil ver seu filho chorar ou expressar
sentimentos como impaciência, raiva, medo.
Aclamar… o tempo do bebê!